Troca de Saberes. Se o Zoom, aplicativo e vídeo conferência, se transformou no palco para os atores, atrizes e cantores, para os capoeiristas do Grupo Cordão de Ouro de Campinas ele se converteu na academia, quando não na própria roda de capoeira, onde habitualmente se aprende a arte da capoeiragem.

Como é possível a pratica da capoeira se a razão para que ela aconteça é o ajuntamento das pessoas? Pois bem, a exemplo de outras manifestações artísticos-culturais como o teatro e a música, a capoeira também teve que se reinventar nesse momento. A utilização das lives entre os capoeiristas explodiu após as medidas de isolamento de combate ao Novocoronavírus; os eventos que antes estavam agendados para acontecerem em espaços culturais e ginásios, agora são compactados em minutos e horas na internet, afim de obedecer aos formatos de aplicativos e das redes sociais.

O 1.º Troca de Saberes do Grupo Cordão de Ouro de Campinas, interior de São Paulo foi realizado via aplicativo de conferencia entre os dias 1 a 6 de Junho. Organizado por discípulos e amigos do Mestre Cícero, coordenador do Grupo na cidade e em alguns Estados e no exterior, o objetivo central da mobilização on line foi captar recursos para a manutenção da academia.

Capoeiristas de diferentes regiões do Brasil e de  23 países como Argentina, Chile, Peru, Equador, Colômbia, Panamá, Costa Rica, EUA, Canadá, Guam, Espanha, Alemanha, França, Itália, Grécia, Rússia, Índia, China, Japão, Austrália, e África do Sul se movimentaram durante uma semana de atividade intensa como treinamentos, mostras de vídeos, oficinas e seminários sobre a capoeira.  A média de participação foi 120 capoeiristas por lives. Para cada dia foram oferecidas 4 lives com mestres e professores ministrando aulas de diferentes continentes. O desafio foi a adaptação do fuso horário.

O Grupo de Capoeira Cordão de Ouro de Campinas funciona há mais de 30 anos no mesmo endereço na região central e histórica da cidade. Fortemente impactado com as medidas de isolamento, a academia teve que fechar as portas temporariamente, mas as despesas se mantiveram mesmo com a concessão de descontos em razão do período. Parte da receita da academia do grupo provém da cobrança de mensalidade, além da comercialização de produtos ligados a capoeira.

Mesmo em tempos normais a dificuldade em trabalhar com preservação e transmissão de cultura não é fácil. A gestão do espaço da Cordão de Ouro Campinas só tem sido possível graças as iniciativas e mobilização dos discípulos de Mestre Cicero.

Sob sua liderança, coletivo do qual faz parte e que reúne mais seis mestres de capoeira, a maioria discípulos aguardam há três meses o resultado de da solicitação para a certificação como Ponto de Cultura por meio da Lei Cultura Viva 13.018/14.

Reconhecido como Patrimônio Cultural Mundial pela UNESCO e por órgãos ligados à Cultura no Brasil como o IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, a capoeira se mantém sem políticas públicas de preservação. Alijado de qualquer forma de fomento público ao menos no Estado de São Paulo, capoeiristas vivem por conta de uma economia própria, criada e desenvolvida há décadas, e que tem sido responsável pela sustentabilidade da expressão.

Muito antes de terminologias e conceitos como Economia Solidária e Criativa surgirem no cenário da cultura, mestres de capoeira já lecionavam, confeccionavam e vendiam seus produtos e serviços, e ainda sim, sob o olhar desconfiado da institucionalidade, a exemplo de tempos passados.

A cada tempo a capoeira se reinventa, sua evolução em todas as dimensões em que atua, arte, esporte, educação, saúde, história, etc, lhe permite a construção de conhecimento. A capoeira é um movimento epistêmico mundo afora. Praticada em mais de 150 países é a principal difusora da língua portuguesa e da cultura brasileira de verdade.

 

 

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