Licença aos mais velhos e aos mais novos. Foto em destaque é de Walter Craveiro. Existem ocorrências na vida da gente que merece a escrita, o registro, uma memória concreta, por isso a urgência de um bloco de anotações, nem que para isso seja um de folhas de verso, bastante útil para quem sabe, eternizar uma frase ou uma simples exclamação, de quem quer que seja. No caso específico, Ailton Krenak, e a eternização do registro seria para a minha escrivaninha, para a capa de um livro preferido, ou para a citação de algum trabalho.
Ailton Krenak simplesmente trovejou concordâncias poéticas e concatenadas na primeira atividade realizada pela Casa de Saberes Ancestrais do Departamento de Cultura da Unicamp em 2019. Não o conhecia com tanta proximidade, sabia se tratar de um ex-constituinte ligado as questões indígenas e ambientais.
Filósofo e Jornalista ganhou esse ano o prêmio Juca Pato como o intelectual do ano com o livro, A vida não é útil. Na Unicamp discorreu sobre diversos temas ligados à nossa principal característica, a colonialidade nossa de cada dia.
O formato de uma palestra constitui um exemplo da arquitetura do espaço que fala Krenak
Para explicar nossa condição, ele se valeu de analises altamente potentes e provocativas. Duas questões capitais passaram a me incomodar cotidianamente após a dissertação de Krenak naquele ciclo de conversas. A primeira diz respeito ao título da crônica. No limite, somos os sujeitos das nossas vidas, as consequências do que escolhemos. Uma pequena lembrança, não somos só. As circunstâncias não é um fenômeno estático, é um fenômeno físico, químico, biológico, sociológico; um fenômeno científico para ficarmos na conjuntura abjeta do terraplanismo.
Nossas escolhas individuais tem efeitos na coletividade. Logo, ser o que eu sou e minhas circunstâncias implica sermos sujeitos coletivos, e isso é um dos paradoxos mais potentes da civilidade.
A segunda, a arquitetura do espaço; podemos entender como uma ilustração cirúrgica de quem somos na mesa, como, culturalmente fomos adestrados a agir, e pensar num ambiente de “autoridades e especialistas”.
Segundo as palavras de Kranek, anotados no bloquinho de papel reutilizado, a arquitetura do espaço é um significante dessa divisão, de experiências e sentidos, e conclui, “é um enunciado dum território ou não”, geográfico e cultural.
Mas afinal, o que quer dizer arquitetura do espaço sob a perspectiva decolonial, e o que Kranek, no alto de sua educação libriana quis nos dizer? Trata-se do espaço normativo, com regras e condutas pré-estabelecidas por um grupo social, que coercitivamente se impõe em prejuízo do outro. A subversão e a mandinga não são bem vistas e vindas nesses espaços, por isso são combatidas, depreciadas, desvalorizadas, simples assim.
A ocupação colonialista produz contradições e tragédias históricas, pode crê. Saravá Kranek.