Todos já ouvimos que é preciso termos cuidado na rua. A preocupação com a ideia de que na rua tudo de ruim pode acontecer faz parte de um arranjo histórico, uma narrativa que de certa forma faz sentido. Fora do conforto e da segurança do lar tudo pode acontecer, pelo menos essa é a sensação. Enfim, a rua é um espaço aberto e de possibilidades, para o bem ou para mal como sentenciava Ruilan Santos, professor de História na cidade de Hortolândia.

As ruas de pedras de Parati-RJ. Foto Luciano Medina

A primeira imagem que vem à cabeça quando pensamos em rua é aquela correspondente a via pública, ladeada de casas, sombreados por sobrados e prédios velhos e sofisticados. Talvez a descrição dessa imagem seja a primeira resposta, talvez a única, daquele individuo atomizado e anestesiado com o fluxo contínuo que Simas classifica como circulação de carros, mercadorias e de corpos domesticados para o trabalho.

Mas existe uma dimensão, e uma definição de rua que transcende a semiótica. Trata-se daquela rua que nos ensina, que nos orienta, potencialmente simbólica que nos proporciona escolhas. Esse aspecto subjetivo da rua é sempre lembrado por poetas, batuqueiros, rebeldes com e sem causa.

Rua dos Pretos Monte Mor-SP. Foto Luciano Medina

Existem agentes de diversos ofícios que valorizam a rua como uma verdadeira sala de aula. Na rua se bate e apanha, aprende-se jogos e jogadas. Na rua se educa a caminhada, quer no asfalto, nas ruas de paralelepípedos, nas ruas de terras ou nas ruas sem vias. A rua é definitivamente uma escola; aprende quem quer, e o que quer.

O professor carioca, historiador, escritor, compositor e batuqueiro Luiz Antonio Simas em seu livro, o encantamento das ruas, numa das saborosas páginas a destaca sob duas perspectivas. Uma delas é altamente transformadora. Ela, “a rua, é um ponto de encontro de construção de sociabilidade, construção de rede de proteção social, e isso é muito forte quando se observa a birosca, o botequim, a quitanda, o açougue de rua, a praça pública, você verifica a sociabilidade rueira”.

Folia de Reis Hortolândia-SP. Foto Luciano Medina

Essa dinâmica da rua é pulsante, vivo, diverso que se articula e se mobiliza a ponto de Gilberto Gil e Celio Turino criarem uma das maiores políticas públicas voltadas para a preservação e valorização da cultura popular e a cultura de rua.

A rua é, portanto, dona da gente. É um espectro que no cerca concretamente, nos dá segurança e nos ameaça ao mesmo tempo. A rua é a simbologia cabal do paradoxo. A rua é EXU, é o bem e o mal, é o céu e a terra, ainda bem. Que a rua seja sempre o que foi, a escola da vida, uma encruzilhada. Saravá.

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