A Educação da Capoeira. A capoeira na Academia
Talvez essa conversa, essa gira devesse ser a publicação inaugural desse projeto pretensamente jornalístico, seguido de um editorial. A ideia das crônicas decoloniais surge após um semestre de aula como aluno especial na disciplina Seminário III – Educação e (de) colonialidade na Faculdade de Educação da Unicamp aplicada pela capoeirista, psicóloga, mestre e doutora em Educação Norma Trindade.
Certamente deveria, mas por razões que o próprio movimento da proposta contém, não foi possível. Fato é que a vivência, as aulas e as conversas decoloniais com a capoeirista e acadêmica Norma resultaram de maneira convicta na formulação desse projeto. Esse diálogo epistêmico de agora, além de um esclarecimento para a movimentação que se pretende, também deve ajudar os interessados em cultura e no tema a se distanciar um pouco que seja, da superfície a que boa parte da capoeiragem e fazedores culturais se encontram quando o assunto é identidade, raízes, preservação, diversidade, apropriação, etc.
A Capoeira. A professora Norma Trindade é alagoana de nascença. Ainda pequena foi com a família para o Rio de Janeiro onde viveu por um longo tempo. Formou-se em psicologia com o interesse em trabalhar na temática da inclusão e os seus desdobramentos. Ainda no Rio de Janeiro, berço da capoeiragem; sob a influência dos irmãos experimentou naquele período sem muito interesse a capoeira.
O despertar de Norma para a capoeiragem surgiu no momento em que ela inicia o processo terapêutico chamado Somaterapia na cidade de São Paulo. A Somaterapia é uma técnica com um referencial político-anarquista criada e difundida pelo médico psiquiatra, escritor e jornalista Roberto Freire, que consiste num exercício libertário que trabalha temas como a liberdade, a corporeidade e o prazer como potência de vida. Freire conhecera a capoeira Angola por intermédio do próprio mestre Pastinha. Logo se identificou com a ritualística e dinâmica daquele estilo, livre e malicioso. A capoeira é o berço e resistência lembra Norma.
A capoeira ressurge na vida da psicóloga Norma através de uma demanda pessoal, da vontade de resistir, de questionar e fazer os enfrentamentos frente a sociedade opressora, machista e consumista. Essas questões de certa forma a movem para a gira da capoeiragem.
Ao chegar em Campinas em meados da década de 90 ela encontra a academia Movimento Axé, do Mestre Geraldo, conhecido como Pescoço e pertencente a linhagem de Mestre Tarzan. A partir dali a vida de capoeirista de Norma se desenvolve, ela conhece seu companheiro e também capoeira Professor Mauricio. A vida de capoeira é um movimento constante, e em 2013 é formada como professora de capoeira por Mestre Formiga do IBECA.
Muito antes da sua feitura ela já contribuía enormemente para a pratica e ensino da capoeiragem. Realizou atividades de extensão no espaço da universidade sempre com o objetivo enfatizar os costumes e rituais dessa manifestação diaspórica.
“Com o tempo fui me encantando com os saberes e com os rituais. Com a riqueza da capoeira, tanto do ponto de vista cultural, mas sobretudo o relacional. A capoeira se tornou para mim um lugar de acolhimento, de pertencimento.” A interação e a troca de conhecimento é constante.
A seguir um resumo da decolonialidade da conversa. É imperativo destacar esse aspecto dada a relevância prática e conceitual do diálogo. Trata-se de um aperitivo. O compromisso de publicar a conversa na integra fica a cargo das crônicas que virão na sequência, e em forma de pílulas. Essa foi a maneira encontrada para compartilhar na integra cada aspecto da conversa, rica de ideias e de conteúdo extraído num papo de 1 hora. Entendam cada crônica como um jogo, uma vadiação, e uma aula; daquelas que pude frequentar como aluno especial em 2019 na Faculdade de Educação da Unicamp.
Dito isso, vamos a resenha da vadiação.
O ponto de partida para Norma chegar até o pensamento decolonial e seu trabalho com os movimentos culturais diaspóricos passou inicialmente por um outro movimento, o da inclusão. Essas ideias e esses conceitos se conversam. Mas inclusão segundo Norma não se restringe a uma ideia geral relacionada as pessoas com deficiência. “A ideia de inclusão é mais abrangente. Inclusão tem a ver com uma luta, uma disputa de espaços e pertencimentos movidas por diversos movimentos sociais. Inclusão tem a ver com tensionamento de acesso, entre fronteiras estabelecidas historicamente. Inclusão tem a ver com produção de conhecimento”. E por meio dessa movimentação que a capoeirista Norma chega aos estudos culturais.
Antes de iniciar essa incursão ao pensamento decoloniail. Em Portugal Norma participa de um Seminário sobre inclusão e lá conhece uma professora que trabalha com a literatura africana. O que poderia resultar da conversa entre uma capoeirista e uma estudiosa em histórias e estórias do continente que possibilitou ao Brasil ser o que é na dimensão da cultura? Ideias! Não deu outra, a partir dali a capoeira rompeu mais uma fronteira, a do campo epistêmico e a possibilidade de redescobertas particularmente através da singularidade e particularidades inerente a professora e capoeirista Norma Trindade.
Um dos primeiros movimentos foi em direção a uma obra vastíssima e esclarecedora, as Epistmologias do Sul de Boaventura de Sousa Santos, sociólogo português que provoca a reflexão acerca do monopólio da produção científica pelo modelo eurocêntrico. Boaventura argumenta e demonstra através da obra que há produção de saberes produzidos fora do padrão cientifico estabelecido como central e único.
Nesse momento, a professora e capoeirista assenta sua cabeça sobre o encantamento do que é a fresta, a sincope, a gira de uma roda de capoeira quer na academia, quer na rua; como se estivesse num barracão da Jurema sagrada, num terreiro de candomblé de Angola, ou numa roda de samba no botequim da vila, e a toma como sujeito de estudo.
Provocada em que momento se dá a aproximação da prática da capoeira com o pensamento decolonial, a professora responde dizendo que essa …
proximidade se conecta por meio de articulações que nós podemos fazer. Porque a capoeira em si é um acervo de saberes, praticas, histórias, etc. É um bem cultural,
…explica Norma.
A idéia e a contribuição do pensamento decolonial de acordo com Norma é de abrir possibilidades, de produção de conhecimentos, de saber, ou seja, abre possibilidades de coexistência, em termos de modo de vida, em termos de pensamento, e em termos de sentimentos.
A capoeira enquanto um movimento cultural e diaspórico propõe possibilidade, a exemplo da encruzilhada. Você tem a liberdade de fazer escolhas e fugir da monocultura.
“A capoeira é uma possibilidade da gente se manter em existência, porque ela demanda do nosso corpo, através de movimentos desequilibrantes. O capoeirista sabe disso, treinamos o corpo para isso. A capoeira se assenta basicamente no deslocamento, e não na fixação. A gente precisa se deslocar, não só o corpo, mas o pensamento, no sentido de considerar e reconhecer que existem outros modos de conhecer e produzir conhecimentos.” Norma.
Enfim, a capoeira na decolonialidade ou a decolonialidade na capoeira é um movimento constante de trocas de informação. É um jogo, uma vadiação ininterrupta de pergunta e resposta. Como informado anteriormente, esse é um resumo introdutório da contribuição e do pensamento da professora e capoeirista Norma Trindade. Aos interessados o acesso a elaboração na integra desse jogo de memória, podemos dizer assim, será democratizado e disponibilizado através de crônicas a serem veiculadas no blog. Informação não vai faltar. Gratidão à professora e capoeirista Norma Trindade. Asé.
Aqui é a Aline Xavier, gostei muito do seu artigo tem muito
conteúdo de valor, parabéns nota 10.
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